Quero convidá-los a refletirem sobre esta frase bastante comum: “eu me casei com você e não com sua família”.
Vou falar sobre alguns conceitos básicos da terapia sistêmica e pressupostos da PNL e como eles dialogam na compreensão desta crença. Sim uma crença e vejamos porquê.
A terapia sistêmica compreende a família como um conjunto complexo de subsistemas funcionando como uma totalidade. São pessoas comunicando-se com outras pessoas e estas relações estabelecem a coesão e os códigos de pertencimento ao sistema como um todo. Ou seja, nascemos em uma família e junto com nossa herança genética recebemos a herança emocional, afetiva e desenvolvemos nossos valores, hábitos, crenças.
A PNL estuda como construímos nossos modelos subjetivos de mundo a partir da realidade objetiva, portanto, compreendemos e interagimos com o mundo a partir daquilo que interpretamos dele.
Um dos pressupostos básicos da PNL é \”mapa não é território\”. O que isso significa? Território é a realidade objetiva, o fato. Mapa é a leitura do território, é a realidade subjetiva de cada um. Nosso cérebro filtra a realidade, distorce, omite e generaliza construindo um modelo único de realidade. Portanto, a realidade objetiva difere da subjetiva.
Relacionando os dois conceitos, o que acontece então é que desenvolvemos um modelo individual de mundo, o mapa, através dos filtros internos e compreendemos a realidade objetiva, o território, em função da nossa complexidade individual que é desenvolvida principalmente no sistema original, a família, de acordo com seu código de pertencimento.
Claro que também recebemos influência de outros sistemas, como a sociedade em que estamos inseridos, nossa fisiologia e até de vidas passadas, segundo algumas crenças, mas este não é nosso foco neste texto.
Voltemos à crença sobre o casamento. Muitas pessoas quando se unem e formam um casal acreditam que são apenas os dois que estão se unindo, mas na verdade é todo o sistema familiar de um com seu mapa, que está se unindo com o sistema familiar do outro, que também possui o próprio mapa sobre o que é um casamento. Cada um é o que é graças à sua ascendência.
A formação de um casal é uma relação que geralmente se inicia carregada de grande emoção e afeto. Significa passar a conviver mais proximamente com o parceiro, compartilhar os projetos de vida, planejar, realizar e aprender juntos a lidar com os conflitos, as crises, enfim, criar um novo espaço relacional, uma nova família. Quando acreditamos que a única maneira correta de se relacionar é a que conhecemos e passamos a desejar, muitas vezes até exigir, que o outro se anule e adote o que achamos correto, estamos ignorando toda a complexidade do outro e o fato de ele ter uma origem diferente da nossa. É como buscar se relacionar não com o outro, mas com o que eu espero que ele seja, negando-o como indivíduo.
Como lidar com isso? A família se desenvolve através de estágios, crises previsíveis que quando encaradas como parte integrante do desenvolvimento e elaboradas adequadamente, mobilizam recursos para mudanças e crescimento, mesmo que acompanhadas de sofrimento. Quanto mais flexíveis forem os pares, maiores as chances de enfrentarem estas crise como aquilo que verdadeiramente são, oportunidades para crescimento e assim construírem uma relação de forma saudável. Flexibilidade significa compreender que talvez as minhas escolhas nem sempre serão as mais adequadas, talvez as dele também não, e talvez nós dois possamos, juntos buscar novas respostas, novos comportamentos que abarquem as necessidades internas de ambos, sem imposição, mas com disponibilidade para aprender juntos, com respeito àquilo que cada um traz de suas origens.
Os conteúdos conflitantes surgem através da comunicação e o significado da comunicação é o resultado que ela gera. O significado que se quer transmitir pode não ser o significado recebido pela outra pessoa.
Interpretamos a mensagem a partir de nosso mapa, que nem sempre, ou na maioria das vezes, não é o que o emissor quis dizer. Por exemplo, se um homem veio de um sistema familiar onde não se fala de sentimentos e afetos ele pode interpretar os pedidos de sua esposa de uma declaração de amor como algo sem sentido e constrangedor. No mapa dele gestos, atitudes como dar presentes, por exemplo, são indicativos do seu amor, no mapa dela a falta da declaração explícita pode ser indicativo de que ele não tem certeza se a ama.
Compreender a dinâmica sistêmica do outro e assim não esperar dele o que ele não pode dar é um bom começo, bem como mobilizar recursos que permitam saber escutar, perguntar e ser curioso sobre a comunicação do outro sem criar “macaquinhos no sótão” e juntos buscar um caminho que atenda às necessidades de ambos. Isto requer flexibilidade que, como qualquer outra habilidade, pode ser desenvolvida.
Sendo assim, negar o sistema de origem do parceiro é negar a existência dele enquanto ser único. Honrar e respeitar as famílias de ambos, é o primeiro passo para um relacionamento equilibrado.
O verdadeiro amor consiste de respeitar e aceitar as escolhas, o caminho e o destino de quem se ama.